Saturday, February 28, 2004

Quando quero inspiração eu leio entrevistas de diretores revoltados, são as melhores;

"Normal love isn't interesting. I assure you that it's incredibly boring."
"People like Truffaut, Lelouch and Godard are like little kids playing at being revolutionaries. I've passed through this stage. I lived in a country where these things happened seriously."
"You have to show violence the way it is. If you don't show it realistically, then that's immoral and harmful. If you don't upset people, then that's obscenity."

POLANSKI

Friday, February 27, 2004

DESENHANDO PERSONAGENS



Aqui estão alguns rascunhos de personagens, nada definitivo.

Nem a descrição está pronta, o que estiver em bold é meio que o pensamento inconsciente do personagem. Só fiz dois até agora.




OS PERDIDOS PRINCIPAIS:



RODRIGO (ego?): Guitarrista de uma banda que não decola, se vê perdido por não querer se encaixar naquilo que a vida lhe impõe. A idéia de abrir um bar nasce dele.
Mote: “Ouça, olhe, escolha e faça.” ou “Para criar você tem que perder o medo de estar errado.”


ANA: Perdeu seus pais e irmãos durante a faculdade, ainda vive na mesma casa, vazia. Desorientada, abandonou a faculdade logo no começo, foi lá que Rodrigo a conheceu.
Mote: “Eu não confio em uma pessoa sã.” ou “Eu fecho meus olhos para conseguir enxergar.”
At this moment, in this cafe, we're sitting next to strangers. Everyone will get up, leave, and
go on their own way. And they'll never meet again. And if they do, they won't realize that it's not for the
first time.


GEBARA (id?): Amigo de infância de Rodrigo, em uma amizade que permanece forte mesmo depois de quase vinte anos. Seus raciocínios são desconexos graças ao seu consumo diário de maconha. Quase nunca se lembra do que aconteceu ontem, mas consegue descrever perfeitamente todos os detalhes pelo que já passou.
Mote: “Porque deixar para hoje aquilo que você poder fazer fumado amanhã?” ou “o que todas as pessoas querem é alguém que as escute.”


NANDA: Passou os últimos dois anos vivendo em um balneário (Floripa?), acreditando que o mar poderia ser companheiro, mas na verdade o mar só a lembrava que estava sem rumo. Volta para São Paulo para recomeçar sua vida.
Mote: “Para todos os lugares que já fui, encontrei um poeta que esteve lá antes.”
Todo dia olho pela minha janela como se fosse uma moldura de lugar nenhum. Sinto falta de uma certa vista, de um certo lugar, de um certo eu que não está mais em lugar algum.


BETO: O único dentre eles que tem uma fámilia rica, porém uma briga com o pai o deixa subitamente desfalcado. Seu orgulho lhe impede de voltar a falar com sua família. Usa o resto de dinheiro que lhe sobrou na sociedade com o bar. Ele é quem menos tem noção do valor do dinheiro, por isso ele é quem mais bate com a cabeça na parede.
Mote: “Minha mãe sempre teve problemas comigo, mas acho que no final, ela gostava.” ou “O prazer não está nas coisas, mas em nós mesmos.”


RUSSO (superego?): É o pé no chão, que procura sempre baixar a bola dos outros. Abandonou a GV para abrir um ponto.com que foi a pique. Com o orgulho ferido, ele não aceita mais erros, sua intransigência na administração torna o bar possível.
Mote: “Salve um pouco de dinheiro todo o mês, e no final do ano você ficará surpreso com o quão pouco dinheiro que conseguiu.” ou “Medíocres não reconhecem nada acima deles, mas talentos reconhecem gênios instantaneamente.”


JÚLIA: Menina lesada por ácido que se deixa levar por qualquer um que se aproxime. Estuda na ECA nos últimos seis anos sem previsão para acabar. Sua bondade é confundida com ingenuidade, o que lhe deixou com fortes cicatrizes que lhe atrapalham a percepção do que os outros são.
Mote: “Você precisa ser pobre para saber o prazer de dar algo a alguém.” ou “Uma amizade que cessa nunca foi real.”






OS PERDIDOS SECUNDÁRIOS:



GENI: Proprietária do sobrado onde antes funcionava um pequeno bordel (o Zepelin), cansada de guerra, aluga o lugar para Rodrigo.
Mote: “A vida é uma doença sexualmente transmissível.” ou “Eu me lembro quando o ar era limpo e o sexo era sujo.”


TOMAZEDS: Pretenso revolucionário que não tem fé em nada a não ser na sua própria verdade. Mora junto com Rodrigo, que tem que suportar a personalidade estupidamente esquizofrênica de Tomazeds.
Mote: “A palavra ‘politicos’ é derivada da palavra ‘poli’ que significa muitos. E a palavra ‘ticos’ significa ‘malditos parasitas sanguessugas’.” ou “Eu vi o futuro e ele não funciona.”


REBOQUE: O outro que mora junto com Rodrigo, muito inteligente porém sem qualquer iniciativa para sair da bolha. Sempre se apaixona, mas fica sempre no platônico.
Mote: “Qual é a utilidade de um mote se você não pode mudá-lo?” ou “A vida é um mote.”


LUANA: Garota eternamente apaixonada por Beto que não consegue aceitar que não há mais amor por parte dele. Detalhe implicíto: ela nunca teve um orgasmo.
Mote: “O único remédio para o amor é amar mais.”



SEU ZÉ: O porteiro bêbado do prédio de Rodrigo. Tenta resolver os problemas do condomínio, e só consegue piorar.
Mote: “Quando eu leio algo sobre os males da bebida, eu paro de ler.”
A Dona encrenca é a pior,


MARCEL: Vocalista da banda de Rodrigo, seu ego é terrivel, culpa todos pelos problemas que ele mesmo cria. Mas canta bem.
Mote: “Existem um milhão de maneiras de falhar, mas para o sucesso só existe uma.” ou “Trate seus amigos como se eles fossem se tornar seus próximos inimigos.”

Wednesday, February 25, 2004

A Faculdade


Esses personagens do seriado são pessoas que terminaram ou abandonaram a faculdade. E agora eles que terão que se encaixar no mundo de qualquer forma, menos na forma que inicialmente queriam.

Todos meio que conhecem essa situação diretamente ou indiretamente. Pudera, olha só a sequência das coisas: quem acaba o colegial se vê em frente à ficha de inscrição na FUVEST, e tem que escolher naquele momento o que fará pelo resto de sua vida. E o que eles sabem sobre a vida? O 'vou tentar', porque até aqui tal estratégia tem dado (aparentemente) certo.

Quase nenhum deles percebem que ao 'tentar' estarão escrevendo um capítulo de suas vidas. Entram na faculdade e descobrem que a vida de faculdade não é nada diferente do colegial, dá pra ir levando, o 'vou tentando' continua dando (aparentemente) certo.

No meio desse 'achômetro' institucionalizado chamado faculdade, se criam as primeiras baixas. Aqueles que por algum motivo levam a faculdade como algo terminantemente ‘sério' se sentem perdidos pela falta de uma reciprocidade 'séria' tanto dos colegas quanto da maioria dos professores. Esse mal parece brasileiro, mas não é, e no Brasil há exceções como há em qualquer outro lugar. As faculdades americanas na sua maioria não são muito diferentes deste 'achômetro institucionalizado' que conhecemos aqui.

Mas a diferença é que lá o medíocre pode arriscar, ele não rebaixará de classe social como aqui pode acontecer com qualquer um. Na hora que o brasileiro se vê órfão da sociedade, o que é assustadoramente comum, descobre que o 'vou tentar' já lhe roubou parte de seu futuro. A faculdade lhe ajudou a dar uma falsa sensação de segurança, dizendo que há chão onde não há. A principal consequência é que quase todos os formados acabam procurando uma terceira via para sobreviver, o que acaba acontecendo com os nossos heróis.

Fernando Meirelles disse "desencana que a vida engana"; é meio que essa frase é o que realmente aprendemos na faculdade.

Já dá pra dizer que esse seriado também será sobre o fim da inocência.

Tuesday, February 24, 2004

FILOSOFIA a GRANEL:


Quer saber porque faculdade é uma bosta?

Porque tirei cinco neste trabalho do segundo ano da faculdade sobre pop-art, eu li hoje e ainda me achei genial, eu teria me dado uns oito.



1996?


O modernismo pode ser categorizado com uma coisa que nasce com Goethe’s Fausto. Por isso pode ser traduzido assim: “O modernismo é coisa do passado”.

Essa coisa de matar o passado e criar um pacto com o futuro, de eternidade, de juventude eterna, de fonte da juventude. Essa renovação, sempre vai se criar essa expectativa da renovação, porque ela já faz parte do estabilishment, mas ela não é orgânica como foi no passado.

Este século começa com o conceitualismo, O grande problema e a grande solução foi a introdução da inteligência e do conceito à arte. Havia antes o artista que tinha uma relação com o meio ambiente, com Deus, com o Universo, neste século o Deus passou para dentro, e o ser humano, o artista começou somente a ter relação com o fato existencial dele pintar e de se expressar.

Duchamp desconstruiu e revelou os mecanismos dos quais a arte se expressa. Acabou o Glamour da arte, acabou monet, manet, reibrant, e começou a existir uma busca desesperada de justificar o como a arte é mecanicamente desenvolvida pelo consciente e subconsciente do artista, ou seja conceitualmente.

Este século é o século do existencialismo, do desconstrutivismo, estruturalismo e de todas as filosofias e teorias de como funciona a cabeça. Porque não se pode esquecer que desde penso, logo existo só houve um movimento de âmbito universal que foi a revolução industrial, e que dividiu o ser humano em funções mecânicas, e a cabeça foi esquecida, quando este século retomou a cabeça do ser humano e investiu na cabeça do ser humano não encontrou nada além dúvidas e de um interesse profundo sobre as molas e os pedais que faziam este mecanismo funcionar.

A inocência que foi baseada em crenças civis e religiosas foram para o espaço na década de 60, os tabus foram todos para o espaço. Nada mais era sagrado, tudo estava aqui sob nosso pés, nada demais e mais nada além.

Sobrou para Warhol desconstruir o mito até chegar ao produto e então mitificar o produto.

A Arte acaba num rótulo de sopa. Segue-se uma era em que a arte é algo atrelado à venda de pipocas.

SINCRONICIDADE

a correspondência entre a mente coletiva inconsciente e o mundo exterior

Acho que esse assunto é um tanto David Lynchiano. Jung desenhou um homem-peixe do sonho de um cara, logo depois dão um peixe pra Jung almoçar, mais tarde uma paciente lhe traz imagens impressionantes de peixes de um livro. De noite, uma dona mostrou um bordado com um peixe, na manhã seguinte a primeira paciente que descreve seu sonho era com um peixe gigante. Jung dizia que era comum haver uma reciprocidade do mundo exterior com os simbolos que ele resolvia estudar, foi meio que daí que apareceu a teoria da sincronicidade.

Eu acredito que a palavra destino é uma das mitificações da sincronicidade, digo, quando você encontrou certas pessoas que são parecidas com você e você passou a imaginar a impossibilidade matemática disso ter acontecido, dizem que é destino, eu digo que é sincronicidade.

Sincronicidades são as coincidências que no plano espiritual não são. Não preciso de exemplos, qualquer um que quiser se lembrar, lembra. Sincronicidade é uma força no meio do caos, enquanto que destino seria o caos tendo ordem.

O que a sincronicidade tem a ver com o seriado? Bastante. Porque fiquei pensando não apenas nos porquês pessoais de cada personagem querer fazer parte no bar, mas também como toda a atitude conjunta deles todos ao mesmo tempo. Mesmo com cada um em seu próprio universo fechado, um lapso do tempo coincide deles quererem a mesma coisa de suas vidas; e algo exterior a eles (que faz parte da mesma sincronicidade, o "mestre dos magos") lhes dará a oportunidade.

Para cada um, uma razão, para todos a mesma resposta. É só isso. Básico também.

É uma coisa bonita, e como toda a coisa bonita, pode virar açúcar demais no café. A sincronicidade pode estar na estrutura dos roteiros, mas nunca exibida com obviedade e referência direta.

Sunday, February 22, 2004

O Vilão

Isso aqui é a transcrição de um exercício de roteiro que fiz em uma noite encurralado pela chuva e pelo trânsito em Ubatuba, alguns dias logo depois que me apareceu a idéia desse seriado. Eu pensei logo de cara que se é para ter um vilão, ele tem que ter uma longa história com os nossos heróis. Como ele é jovem, da idade dos outros, o motivo de uma vingança só pode aparecer muito cedo, quando crianças; O cara que se tornará vilão se chama Otávio, esse nome é bem provisório.


Isso aqui é mais um argumento do que um roteiro, para o episódio que entra esse vilão.


03/01/2004


CASA DO RODRIGO MOLEQUE – INT DIA

Lettering: ANOS 80

Ao som de Spectreman, Rodrigo copia os cálculos da lição de casa (um monte de equações do segundo grau).

Do lado de fora, Gebara e Ruy tocam a campainha e a mãe de Rodrigo abre para eles.

MÃE DE RODRIGO (com o dedo em riste)
Sem zona, hein? O Rodrigo tá fazendo a lição de casa.

GEBARA
Não senhora, a gente veio fazer a lição também.

Ruy dá uma cumprimentada no Rodrigo enquanto Gebara muda o seletor preto TV->VIDEO GAME.

GEBARA
Ruy, copia aí, vô jogá um pouco e depois eu copio a lição.

RODRIGO (OFF – do presente, 2004)
A gente tinha os mesmos cadernos que a minha irmã mais velha usava, ela era muito CDF, não tinha erro nenhum no caderno dela, meu, a gente tinha que inventá erro. A gente e a sala inteira, uma corrente mafiosa de cola.


CORTE PARA:
SALA DE AULA – INT DIA

A mesa do professor estava deitada no chão, as cabeças de Gebara e Rodrigo sobem lentamente para tentar ver algo. Um giz zunindo passa entre eles, e mais outro, e outro, e mais outro.

Um moleque entra na sala avisando alto:

MOLEQUE
O psor tá vindo!

A zona de guerra se desfaz rapidamente e ruidosamente. O professor entra, olha pro chão cheio de giz e aponta para o Gebara:

PROFESSOR
Gebara! Fora!

GEBARA
Mas eu não fiz nada!

PROFESSOR
Não interessa, fora!

Gebara sai da sala, o professor começa a aula.

PROFESSOR
Hoje eu não vou passar visto na lição de casa, quem não fez se deu bem hoje.

Ele continua escrevendo equações na lousa, enquanto Otávio copia a lição, recebe um bilhetinho “se você não rolar no chão agora, vamos contar pra sala inteira.”

BETO (OFF – No presente, 2004)
O que que era o segredo do Otávio?

RODRIGO (OFF)
Então, eu tava trocando umas idéias com o Otávio, tipo, falando de punhetaria, essas coisas, tá ligado.

BETO (OFF)
Hmm, acho que nunca conversei esse tipo de coisa com ninguém... e daí?

RODRIGO (OFF)
Então, e aí ele me falou que roubava o sutiã da mãe dele e gozava nele!

BETO (OFF)
É, esse tipo de coisa não se fala pra ninguém.

RODRIGO (OFF)
O que você que dizer com isso? Bem, eu falei depois pro Gebara que me disse “ele se fudeu! Vô contá pra todo mundo!”

BETO (OFF)
Porque você falou pro Gebara? Cê tava louco?

RODRIGO (OFF)
Sei lá, não resisti.

Otávio dobra de volta o bilhete e olha para Ruy e o pessoal do lado, fazendo mímicas para o Otávio rolar no chão. Suando, Otávio se deita e começa a rolar no chão.

O professor escrevendo na lousa, escuta as risadas compulsivas de quase toda a sala. Se vira e olha para o chão onde Otávio estava rolando no chão, olhando sem dizer uma palavra, a imagem não lhe fazia qualquer sentido.

BETO (OFF)
Que maldade do cacete!

RODRIGO (OFF)
O pior era que toda a sala já sabia, ele ficou um escravo até se mancar disso.

O pequeno Gebara vê Otávio rabiscando no lousa, e chega nele com o Ruy. Ruy comanda Otávio:

RUY
Come giz! Come giz agora!

BETO (OFF)
E ele comeu?

RODRIGO (OFF)
Comeu.

BETO (OFF)
Caralho, meu, não é toa que ele te odeia.

RODRIGO (OFF)
Mas esse é só o começo da história, quando ele se mancou que a Joana tava rindo dele por causa da história do sutiã, ele pirou. Ele sabia de todo o esquema de cola que rolava na sala, e ele nunca participava. Foi aí que fodeu.

Otávio se aproxima do professor no final da aula.

OTÁVIO
Psor, o pessoal tá colando todas as lições de casa.

PROFESSOR
Como assim, é como é o seu nome mesmo?

OTÁVIO
Otávio. Eles tem todos os cadernos com todos os exercícios prontos.

PROFESSOR
É verdade isso? Desde quando você sabe disso?

OTÁVIO
Eles já fazem isso a uns dois anos.

RODRIGO (OFF)
Ele foi muito burro, o professor condenou a sala inteira com ele junto, nunca teve provas tão difíceis quanto naquele ano. Todo mundo sabia que tinha sido vingança do Otávio.


CORREDOR DA ESCOLA – INT DIA

Otávio vai andando pelo corredor, e vê quase todos da sala enfileirados nos dois lados do corredor até a porta.

RODRIGO (OFF)
Faziam tudo com ele depois disso, corredor polonês, cróq, baixavam as calças dele o tempo inteiro. Até ele nunca mais voltar pra escola, daí nunca mais ouvi falar dele.

BETO (OFF)
Até agora.

RODRIGO (OFF)
Até agora.

A frase mais deprimente que já ouvi

O PAN, Partido dos Aposentados da Nação, acabou de dizer em rede nacional:
"O jovem de hoje será o aposentado de amanhã."

Soa como vingança, não?

Down to Earth

FILOSOFIA a GRANEL:

Tenho vários textos que tratam da ideologia que eu gostaria de ver nesse seriado. Irei postar alguns que eu acho relevantes como esse:




24/04/2002

Down to Earth
(um longo epitáfio para a geração perdida)


A nossa infância tinha três grandes pilares: Steven Spielberg, Michael Jackson e David Copperfield.

Foram estes três os maiores responsáveis pela cultura anal da década de oitenta. A síndrome de Peter Pan estava generalizada nas roupas, nas músicas, nas cores daquela época marcada pela fuga total da realidade. A década de 80 foi, sem dúvida, a única resposta efetiva contra o existencialismo.

Um amigo meu falou certa vez: tudo na década de 80 entrava ou saia de um buraco. O mundo estava assombrado pela magia, as palavras "efeitos especiais" eram um pejorativo usado apenas pelos ideologicamente céticos. Quando David Copperfield fez desaparecer a estátua da liberdade, ninguém saia correndo para ver o making-of. Descobrir que a mágica era nada além de um gigantesco jogo de percepção, era assassinar a 'criança' que queria ser eterna.

Não sei se foi a desconstrução da mágica, ou o fato dela ter existido um dia foi o que nos fez odiar o mundo, de renegar a euforia de que poderíamos voar se quiséssemos. Quando vemos Michael Jackson cercado de crianças, não pensamos mais nele como um semideus que vem distribuir felicidade entre elas, temos no lugar, a imagem de um pedófilo sem noção se satisfazendo. Uma inversão entre a fantasia e a ingenuidade, entre o imaculado e o imundo.

Tendo nascido em 75, no mesmo ano em que o bebê diabo nasceu no NP, não tenho muitas coisas boas a falar do mundo que acabei conhecendo. Mas por um breve momento nos anos de 96 a 99 eu realmente acreditei que a humanidade poderia alcançar um novo platô.

Não só não o alcançou, como o enterrou e o deixou a 20 mil quilômetros debaixo da terra. Eu sou confiante na idéia de que quem cria o que nos cerca são as nossas expectativas. E nesse momento as minhas expectativas nunca foram tão baixas. Mas antes de falar disso, vamos falar da nossa maior maldição: AIDS.

Antes sexo era uma contravenção, um tabu, algo que tinha que ser escondido dentro de um baú no sótão da casa. Só na década de 60 que se pensou um pouco melhor sobre isso; com o anticoncepcional, o sexo podia ser transgressivo sem mais punição. Então que veio a anal e ortodoxa era de 80, e numa época de direita a AIDS era conveniente.

Os primeiros punidos foram os Gays nas saunas de San Francisco. Assistindo o Comando da Madrugada, víamos michês e travecos apodrecendo com fungos crescendo sobre a pele. E sempre tinha a conotação involuntária: ‘é isso que dá’. Eu acho que tinha menos de dez anos quando vi essas imagens.

Como um adolescente encara a AIDS? Sempre burramente: ou sente um medo incondicional ou tem a total ignorância, se não ambos. Gerou-se uma esquizofrênica cultura ao sexo, onde o sexo é liberado, mas não libertino. Bond quase não transou na década de 80.

Não podemos nem lutar contra isso, afinal é a realidade. E talvez por isso o virtual tenha tomado tanto corpo na década de 90, existia até a pretensão do sexo virtual.

Uma inversão de Matrix pode ser a melhor transcrição do medo dessa nossa geração:\> o medo de que tudo que somos é apenas virtual, que existe para esconder a triste realidade de que o mundo é o que sempre foi, de que somos pilhas Duracell e criamos uma fantasia para fingir que não as somos. Era um sentimento que descendia desde os Grunges de Seattle, que na busca de uma atitude sincera, e por isso inconsciente, descobriram que odiavam o mundo. Cobain se matou em 95, no mesmo ano que despontou Chemical Brothers e as Raves pelo mundo.

Na resposta de odiar o mundo, foi encontrada a catarse, o ê e a música que não podia ter começo ou fim. A Rave durava não se importando se era dia ou noite, nada podia barrar um ritual que não estava interessado em ter qualquer limite.

Foi uma época de deslumbramento de algum vislumbramento. Um sonho construído que faria uma cultura sem as massificações e sim com a individualidade. E essa ideologia partiu para todos os lados da minha geração, conquistando a razão até de nossos pais, pois estamos certos; infelizmente o mundo é sempre um lugar errado para idéias certas.

Assistimos pela TV a queda do muro, e eu havia dito em 98 que não haveria mais guerras, de que os interesses não dariam mais para serem medidos por forças militares, e sim por quem estava realmente no poder do mundo globalizado, os grandes bancos, e afinal bancos têm títulos e não ogivas. Ingênuo, não?

Quando a globalização começa a agir num posto de gasolina da Exxon em kentucky é melhor revogá-la. Bem, isso foi um choque para a minha geração, que tinha os valores bem claros a respeito de que para todos os jogos existem suas regras. E a lição que tiramos disto é de que nunca houve jogo.

As duas torres caíram junto com o resto de esperança por um mundo descente. Os árabes deram o aval para um revival de um pesadelo imperialista norte-americano: expulsar chicanos, apoiar golpes de estado, jogar cowboys no deserto, etc.

As guerras, pelo visto, nunca acabarão, parece um monstro íntimo da humanidade que sempre desperta das sombras. Assim sendo, teremos que conviver forçadamente com as mundanas fatalidades do ódio racista e cultural pelo resto de nossas vidas.

A minha geração está no limbo, se sente impotente em relação à tudo: ao sexo, ao trabalho, à política, às guerras, à pobreza. Como se em um momento tivéssemos todo o poder do mundo que na calada noite sumiu. Foram-se as Raves, a Internet, e até aquela raiva do mundo. Se isto é amadurecimento, eu não a quero.

Another brainsnow:


LISTA DE NOMES & APELIDOS RAZOÁVEIS que fiz agora:
(sem compromisso com nada, só tô chutando personagens da cidade)

Wallace (nome de porteiro)
Dário (nome de irmão revoltado)
Tomazeds (o amigo do amigo)
Cura d’Ars (nome falso cafona gay)
Doloroso (apelido de jogador de futebol frustrado)
Eu Exijo (apelido do pai do amigo)
Lulujubis (apelido da garota mais nova da turma)
Fedex (apelido de motoboy)
Cisquinho (moleque que guarda carros)
Jerwásio (agitador de festas)
Luquinhas (irmão mais novo da mina que cê tá afim)
Palito (o cara que não sabe seu apelido é Palito)
Trombada (cara desengonçado que provoca acidentes)
Profeta (cara mais velho que caga regra)
Reboque (cara gente fina que sempre ajuda as minas que dão blackout em festa, mas não cata)
Sacadura (faxineiro que só reclama)
Tibau (negão catador)
Zézio (corno)
Leminho (operador de som)
Werneckinho (filhinho de papai)
Francês (véio das Guianas)
Patê (cara seboso)
Dré (amigo das minas)
Lerdo (cara que pensa demais e quando faz demora demais)
Caloteiro (tipo Seu Madruga mesmo)
Bêlha (nanico que se intromete em qualquer coisa)
Malones (o cara não é tão mala assim)
Dona Encrenca (vizinha)
Tuca (garota que faz teatro)
Belantónio (tio mais velho)
Diocleziano (primo do interior)
Moché (diminutivo de Aimone)
Milofa (namorada do Moché)

A idéia do seriado até aqui

A primeira sensação de que um seriado me parecia necessário foi quando percebi o quão invisível São Paulo é. Nada na TV brasileira consegue dar um traço real do que essa cidade nos parece. Nós a dividimos em caminhos conhecidos e desconhecidos, em que a esquina errada pode ser a danação. Mas ao mesmo tempo em que ela nos cerca com labirintos em todos os sentidos, nós não conseguimos vê-la.

O ser paulistano é estranho, basta morar aqui para ser um. Odeia onde está, porém não aceita o ódio. Cai em devaneios de fugir de uma cidade que ele não consegue se desvencilhar. Tudo está aqui e nada está aqui. Todos os ambiciosos do país estão aqui, mas o prazer que procuram está longe daqui.

No meio desse labirinto de concreto e de pessoas, alguns conseguem enxergá-lo de cima.

E esse seriado é sobre esses alguns. E sobre uma cidade que parece que nunca ninguém viu.

Se a questão do ‘enxergar’ o labirinto de cima é benéfico ou não (“ignorance is bliss”), sei lá, uma hora a gente descobre.

Ok, toda essa idéia ficou cozinhando durante um mês ou mais, até que em umas das idas ao Fun House me criou curto-circuitos entre idéias. Talvez por três fatos:
1) o Fun House é no pedaço mais decadente da Bela Cintra (belo nome), cercado de neo-cafetões e putas da augusta.
2) e que apesar disso, é um ambiente terrivelmente familiar (tal como era o Sotão, uma boa segunda opção para o seriado, a Vila Madalena pode ser clichê, mas até agora ninguém entendeu exatamente que diabo é esse bairro)
3) e é um ambiente familiar por que o bar nasceu de uma junção de amigos; um lugar se mantém sempre fiel à natureza que o criou.

Ver corta muitos caminhos, ver um lugar que realmente existe, ao invés imaginar cenários possíveis é estupidamente facilitador tanto para as concepções quanto para gerar o real no tape. O contraste do que o Fun House é perante o que lhe cerca, representa bem os contrastes esquizofrênicos dessa cidade.


Talvez eu tenha uma certa fixação pelos Goonies, por isso fico imaginando um seriado com amigos apenas, a família ficaria em segundo plano. Talvez eu também tenha uma certa fixação pelo Caverna do Dragão. Talvez tenhamos que criar um Mestre dos Magos para ajudar estes amigos.

Bem, a primeira idéia que apareceu é deles serem donos do Fun House, é claro.

Inclusive a idéia de se colocar o nome de Fun House no seriado é bem sedutora.

Frisando

É bom frisar que todas as idéias novas e velhas sejam questionadas sempre. Mesmo que isso faça um giro de 360 degraus (senão mais) na concepção do quer que tenhamos em mente.

Friday, February 20, 2004

Problema número 1: Viabilidade


São dois problemas na verdade, um é a produção do piloto, outro é o patrocínio.

Mas antes de tudo, tenham em mente o formato: episódios de 22~24 minutos, sem risadas gravadas, não é um sitcom. É sobre um bando de perdidos da nossa geração na são paulo capital.

Começando pelo segundo, o patrocínio. Que também é um outro monte de problemas. Se quisermos abordar o homossexualismo, perderemos facilmente o patrocínio de absorventes. Assim como falar da maconha ou até mesmo do cigarro. Poderíamos insinuar, mas é tão falso quanto não falar. Mas mesmo fazendo isto, o nosso leque de patrocinadores altruístas é reduzido a zero. Ninguém vai querer anunciar nele para querer uma associação direta com um seriado como esse, só terá olhos para a audiência dele.

Então, a nossa única opção é conseguir audiência. E eu sei que estou falando o óbvio, mas isso terá que ser dito antes de qualquer escolha daqui em diante.


O primeiro problema, a produção do piloto: é que ele não pode custar mais do que um chapéu.



Assustador não é?

Thursday, February 19, 2004

Algumas explicações

Farei deste blog uma ferramenta de comunicação com as idéias que circulam a respeito do nosso atual projeto. Como a idéia inicial foi minha, acredito que este diário me ajude a manter a liga daquilo que eu pessoalmente penso dele, e dizer a todos os cúmplices isso. Não quero que ele seja unicamente de criação minha, eu quero justamente o contrário.

A alma do seriado depende muito disso.

Escrevi esse texto uma semana antes do 11 de Setembro, no apê da Vila Mariana a long time ago, será ele el primeiro post.



THE BRAZILIANS ON THE MOON JOURNAL




EDITORIAL


Tenente Halcacézar Augusto

Domingo, 01 de Setembro de 2001.

BASE NÓBREGA PEIXOTO, LUA: Hoje comemoramos muito por aqui. Pois pudemos ter mais um lindo entardecer aqui da Lua. Primeiro a penumbra sumindo dos últimos raios solares, criando um lindo anel de cores vindo do Sol. E neste entardecer vimos o Brasil lentamente desaparecer na escuridão. Fantástico. Gravamos a seqüência inteira. Com certeza essa é melhor do que as outras trinta e sete filmagens do mesmo fenômeno.



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JORNALISTA ENLOQUECE NA LUA

BASE NÓBREGA PEIXOTO, LUA: O jornalista Mirto Gonsalves foi enviado para a Lua na última missão da nave interorbital Niemayer I, a cerca de dois anos, um pouco antes da desvalorização do Real. Sua missão que era ficar menos de um mês acabou durando 30 meses. Ele manteve a serenidade por todo este percurso, porém nestas últimas semanas ele tem se comportado de maneira muito pouco amigável. Abaixo a transcrição do texto enviado por ele para a sua coluna neste jornal:

Mirto Gonsalves (jornalista especialmente enviado para a Lua)

Me irem daqui PELAMOR DE DEUS!!!

ESTOU FALANDO SERIO! Eu estou usando esta coluna para um apelo pessoal urgente. TIREM-ME DAQUI. Não dá pra esperar o dolar baixar, ele não vai! Façam alguma coisa antes que eu ENLOUQUEÇA! VOU COMEÇAR A MATAR ALGUÉM AQUI!


De fato, o dólar alto desviabilizou a construção da Niemayer II. Logo não teremos previsão de quando poderemos voltar para a Terra. Muitos aqui estão sensibilizados com este fato em particular. Mas o governo já confirmou que estudará se o custo total da construção da próxima nave –avaliada em 19 bilhões de dólares, cerca de 55% do valor do próximo empréstimo do FMI - conseguirá ou não entrar no orçamento do ano que vem.

Na base lunar Nóbrega Peixoto mais cinco pessoas apresentam sintomas de enlouquecimento. Somados aos outros dois habitantes são quase 90% da população lunar.


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MIRA RUIM DÁ TRABALHO PARA OS 'GANDULAS'

BASE NÓBREGA PEIXOTO, LUA: Atualmente os suprimentos para a base lunar Nóbrega Peixoto, conhecida também como Pirizão, são enviados através de grandes canhões do Brasil (na base de Poço Alto, MA). É um método rápido que tem funcionado, mas ultimamente tem havido dois graves problemas: 1) temos que buscar os suprimentos jogados aleatoriamente em um raio de mais de 300 km pelo leste da Lua. 2) Os suprimentos não estão mais sobrevivendo ao impacto.

Este último problema é considerado o pior por todos os oito habitantes. Que estão tendo que comer leite condensado diariamente, pois é uma das poucas coisas que sobrevivem ao impacto. Já o copo de maionese é o produto mais bem cotado no mercado negro lunar.



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VIDEO CASSETE PIFA E PROVOCA GREVE NA LUA

BASE DE POÇO ALTO, Terra: Um movimento liderado pelo astronauta Elias Maguzo dificultou as principais atividades na base lunar Nóbrega Peixoto, o Pirizão.

Segundo o líder da greve, o video cassete da área de lazer da base foi sabotado, este aparelho era única fonte de diversão para os habitantes da Lua, revendo continuamente as novelas Rainha da Sucata e Meu Pé de Laranja Lima .

A investigação se segue conforme os pedaços do aparelho estão sendo encontrados em diversos pontos da área de lazer da base. O Brasil planejava enviar no próximo ‘tiro’ (do canhão White-Westinghouse localizado no Maranhão) os lançamentos ‘Jerry Maguire’ e ‘The Wonders – O sonho não acabou’.

O governo brasileiro estuda qual outra peça de entretenimento poderia ocupar o espaço vago das duas fitas de vídeo. Fantoches estão sendo estudados como opção, versões reduzidas de War e Imagem & Ação também estão sendo estudadas.


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AUSÊNCIA DE MULHERES PERTURBA ASTRONAUTAS

BASE DE POÇO ALTO, Terra: Entre os mantimentos enviados à Lua, são mandados vários exemplares das revistas Fiesta, Sexy e Brazil continuamente. O governo acredita que isto tem sido suficiente para os astronautas brasileiros combaterem a alta escassez de exemplares de membros do sexo feminino.

O astronauta Namaro Costa acredita que não quando falou pelo rádio na última quinta-feira a respeito do assunto: “vão tomar no c- seus filhos da p---!”. O governo disse que talvez abra concorrência para encontrar mulheres dispostas a ir à Lua, mas com passagem só de ida, já que fazer um foguete que vá e volte é muito caro para o orçamento brasileiro. Mas infelizmente tal missão não se concretizará nos próximos três anos.

Alguns insiders dizem que é possivel que governo aceite fazer uma parceria com a Rede Globo para criar um quadro no programa dominical Faustão. O objetivo seria os espectadores escolherem-nas através de seus talentos e atributos físicos -- “Claro que elas serão condenadas a morar na Lua, mas quem vai querer dispensar ser uma das mulheres mais famosas do país” disse um dos diretores do programa espacial brasileiro.